A miss o dos pais
RENATO ESSENFELDER
10 Agosto 2015 | 09:58
Parte da missão do pai é ajudar o filho a encontrar tudo aquilo que ele já possuía quando criança, mas perdeu.
arte: loro verz
» Cheguei àquela idade em que pais começam a se multiplicar em meu entorno. Aparentemente, todos são pais. A maior parte dos amigos têm filhos, já. Outros são pais prospectivos: quase-pais, meios-pais que começam a pensar seriamente no caso. Fazem contas, planos, especulam sobre a paternidade possível em um cotidiano que não dá sinais de trégua – quando parece que a vida vai se acalmar, agita-se. Então fecham os olhos e, num descuido imaginado, engravidam. Ninguém é pai com muita matemática.
Não fosse uma dose de acaso, a vida nunca revolucionava. O marceneiro seria marceneiro até o fim das mãos, o professor seria professor por toda a história da garganta, o garçom seria garçom até que as pernas travassem. A surpresa é desconfortável, de início, e às vezes dolorosa, mas faz lembrar do que é feita a vida, matéria do acaso.
Tenho o maior respeito pelos quase-pais matemáticos, dados a minúcias de planejamento, e quem sabe eu mesmo não me torne outro, cuidadosamente orquestrando o segundo filho. Mas intimamente acho que a paternidade é aquele tipo de surpresa indispensável, como o próprio nascimento: caímos no mundo às cegas, às cegas vivemos, às cegas damos à luz. Um belo dia acordamos diferentes. Descobrimo-nos pais.
Assim o homem moderno se conecta ao primitivo, ao homem-de-sempre. Há beleza no deixar que a vida siga seu fio indistintamente, sem antecipar-lhe os passos. Sem antecipar-lhe sexo, peso, cor, dia e hora de nascimento. Abraçar, pois, a vida. Abraçar tudo o que virá – mesmo a morte.
Assim, então, todos nos tornamos pais: não importa o sexo, idade, estado conjugal, quantos filhos de carne e osso depositamos sobre o mundo. Nos tornamos pais pela disposição de abraçar a vida, tudo aquilo que virá, nutrindo, vivendo e deixando viver.
Ser pai, nos tempos atuais, é dar conta