A escrita da pintura
Aprendo a ver. Sim, estou no começo. Ainda vai mal. Mas quero dedicar a isto meu tempo. (Rilke, Os Cadernos de Malte Laurids Brigge)
O pintor Rousseau, ao exibir pela primeira vez a sua obra “O Sonho”(1910), na qual uma dama encontrava-se adormecida em um sofá, numa floresta, ouvindo um encantador de serpentes, foi interpelado por um crítico para explicar a insólita presença de tal móvel numa floresta..Justificou-se alegando que se tratava de um sonho da senhora ao adormecer em seu “divan”, o que já estava explícito no título dado à pintura.
A um amigo, no entanto, Rousseau confidenciou que o sofá ali foi colocado apenas “devido à sua cor vermelha”, necessária à composição do quadro.(imagem 1)
O episódio remete à singularidade da expressão ou linguagem do pintor (ou da pintura) e sua coerência de significados e sentidos.
Aprender a ver, aprender a ouvir, aprender a ler, a escrever, demanda desejo de, atenção, perseverança, tempo, muito tempo de dedicação, já que rompemos, sem nos dar conta, com as práticas do hábito, do comodismo dos clichês, com a linguagem socializada.
Se existe alguma “lição” para apresentar do que trata a arte é a de que, embora esteja conformada pela história, não pertence à história. A criação artística se dá para além da história. A arte é um devir cuja potência maior se dá quando se sai da ordem do vivido, atravessam-se os clichês e rompe-se com o que é reconhecido.
A pintura, portanto não imita, não copia, nem representa uma coisa (mesmo que assim o queira).A pintura cria algo novo
E sua escrita particular, em todos as épocas e culturas, se apresenta como uma longa pesquisa sobre a natureza da vida e da humanidade. São linhas, cores, planos, compondo uma gramática de signos cujos sentidos se oferecem à experiência estética e ao entendimento do mundo.
Por que as obras de pintura sempre se revelam emocionantes, intrigantes ou mesmo indecifráveis? É possível entender a experiência vivida