A ciência e as ciências
Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa http://cfcul.fc.ul.pt Se olharmos hoje para a ciência, o que vemos são as ciências. Não vemos a floresta, vemos as árvores. Não vemos a árvore, vemos as folhas.
Vemos as disciplinas, as subdisciplinas, as especialidades. Por outras palavras, o que vemos é uma poeira, mais ou menos caótica, de programas e projectos de investigação altamente especializados, apoiados financeiramente por decisores, também eles especializados, e enquadrados em instituições nacionais e internacionais, públicas e privadas, umas de carácter político, outras militar, outras empresarial1.
Trata-se de uma situação recente. Ela teve a sua origem no século XIX e a sua máxima potenciação em meados do século XX. A título meramente indicativo, a National Science Foundation repertoreava na década de quarenta, nos EUA, cerca de 54 especialidades; em 1954, dava conta, só na Física, de
74 especialidades e, em 1969, também só na Física, de 154. A partir da década de oitenta, as especialidades passam a contar-se aos milhares.
Uma situação explosiva cujos efeitos se fazem sentir a diferentes níveis da ciência contemporânea, nomeadamente, nas suas formas institucionais, nas suas estruturas organizacionais, na sua capacidade heurística e na sua dimensão cultural.
O balanço crítico desta situação está feito já há bastante tempo. Em 1929, no livro Rebellion de las Massa, Ortega Y Gasset denunciava já, com extremo vigor, o que designava por “barbárie especialista”: "Dantes os homens podiam facilmente dividir-se em ignorantes e sábios, em mais ou menos sábios e mais ou menos ignorantes. Mas o especialista não pode ser subsumido por nenhuma destas duas categorias. Não é um sábio, porque ignora formalmente tudo quanto não entra na sua especialidade; mas também não é um ignorante porque é um "homem de ciência" e conhece muito bem a sua pequeníssima parcela do Universo. Teremos que