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2052 palavras
9 páginas
PONTO DE VISTAA ESTRATÉGIA DO CRIME
Adriano Schwartz1
Folha de São Paulo
O escritor Ricardo Piglia já disse mais de uma vez que não há nada além de livros de viagens ou histórias policiais. “Narra-se uma viagem ou um crime. Que outra coisa se pode narrar?”. A afirmação é intensificada em
“Formas Breves”, há pouco lançado no Brasil, no qual ele diz que “o gênero policial é o grande gênero moderno (...), inunda o mundo contemporâneo”.
Ao contrário do que normalmente se pensa, então, os herdeiros de investigação de Dupin, Sherlock Holmes, padre Brown, Maigret, Poirot,
Marlowe, Spade ocupariam um lugar nobre numa potencial e sempre controversa hierarquia do valor literário.
A própria produção do autor argentino - textos como “Respiração
Artificial” ou “Nome Falso”- confirma que a hipótese pode ser correta. Os inúmeros títulos policiais de qualidade bastante questionável publicados mensalmente, infestados de convenções e temas estereotipados, parecem desmenti- la.
Como a intenção aqui não é criar um enigma insolúvel à espera de mais um improvável detetive, e sim tentar entender um pouco melhor o papel que esse tipo de narrativa exerce atualmente - e por que ele, ao mesmo tempo, consegue ser atacado e defendido de modos tão peremptórios -, vale
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Adriano Schwartz é editor do Caderno Mais! (Folha de São Paulo) e doutor em teoria literária pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP. O artigo acima foi publicado, originalmente, no Mais!, em 8 de fevereiro de 2004.
Endereço eletrônico: aschwart@uol.com.br
Psicologia USP, 2003, 14(3), 195-200
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Adriano Schwartz
a pena retomar brevemente a sua origem e lembrar algumas das modificações pelas quais passou.
O norte-americano Edgar Allan Poe, com Auguste Dupin, personagem de três de seus contos, cria na primeira metade do século 19
(em 1841, com “Os Crimes da Rua Morgue”) o primeiro detetive de fato da literatura policial e estabelece alguns padrões que foram seguidos por vários autores: o narrador é