Um sonho possível
Eduardo Antonio Bonzatto Doutor em História Social
TRABALHO: do latim, TRIPALIU, instrumento de tortura, consiste num gancho de três pontas, cuja função é a evisceração ou a retirada e exposição das tripas, região de intensa dor e de lenta agonia. Foi criado e utilizado durante a Inquisição. “A liberdade pelo trabalho” Placa no portão do campo de concentração de extermínio de Auschwitz Suas técnicas e antes de tudo suas armas de fogo garantindo-lhes sobre os povos munidos de arcos e de clavas uma fácil, esmagadora e duradoura superioridade. Febvre, 2009, p.327.
Dizem que não há nada mais dolorido que a ferroada de uma Tucandeira, uma formiga amazônica também conhecida como Tangarana. Existem sempre duas ou mais versões sobre quaisquer assuntos. O trabalho, essa quase unanimidade, tem também pelo menos dois lados. Todos aqueles que o apreciam, que acreditam que ele enobrece o homem, que é parte fundamental da vida, pois afinal, todos precisam mesmo trabalhar, concebem seus primórdios semânticos da palavra latina “lavoro”, donde lavorar, classes laboriosas, etc. Essas pessoas acreditam basicamente que é pelo trabalho que o homem sobreviveu à noite do tempo. A esses, contudo, devo apontar uma diferença básica e fundamental: durante muitos séculos, entre os indígenas que ainda hoje plantam, colhem, caçam, pescam, a sobrevivência esteve ligada a atividades de sentido. Todas as tarefas eram realizadas como parte integrante da vida, com festas para o plantio, para as colheitas, com cerimoniais para as grandes caçadas e para as pescarias coletivas. Jacques Lizot afirmava que “o desprezo dos Yanomami pelo trabalho e o seu desinteresse por um progresso tecnológico autônomo é certo”1. Tais atividades tinham diferentes sentidos. Se implicavam na sobrevivência do grupo, fortaleciam laços de solidariedade e de comunhão com os outros e com a natureza, fazendo desses grupos verdadeiras morfogêneses naturais,