Sobre a diferença entre a morte e o suicídio
Franciele Bete Petry1
À
primeira vista, é perturbador pensar que, na filosofia de Schopenhauer, mesmo aquele que percebe ser a essência da vida o
sofrimento, não deveria ser levado a cometer o suicídio. Se, em vida, todos os horrores possíveis ao homem ameaçam continuamente sua existência, por que não deveria ele, por sua própria ação, dar fim aos tormentos que não lhe permitem viver felizmente? Se a angústia o penetra em seu mais íntimo ser, se a dor o impede da possibilidade de qualquer gozo, desfrute ou prazer, se o suicídio parece levar a cabo essa penosa submissão a um mundo que nada lhe dá em troca daquilo que dele é tomado a cada instante, por que não o buscar? A franqueza com que Schopenhauer responde nos estremece:
No fundo e em resumo, o que existe no monólogo universalmente célebre de Hamlet? Isto: o nosso estado é tão infeliz que um absoluto não-ser seria muito preferível. Se o suicídio nos assegurasse o nada, se na verdade nos fosse proposta a alternativa de “ser ou não ser”, então sim, seria preciso escolher o não ser, e isso seria um desenlace digno de todos os nossos desejos [...]. Só que em nós qualquer coisa nos diz que não é bem assim: que o suicídio não desenlaça nada, que a morte não é um aniquilamento absoluto (Schopenhauer, 2003, p. 340, § 59).
Assim se vê que, sendo a morte algo desejável e digno diante da cruel existência que acompanha todo e qualquer indivíduo, o meio de fazê-la efetiva não é o suicídio. Este, claramente, põe fim à vida, mas não acaba com a essência dela, qual seja, a vontade. Esta, ao invés de ser negada, é fortemente afirmada, fazendo do ato daquele homem infeliz um esforço completamente inútil para o fim que tanto almejava, que era a eliminação total dos sofrimentos que pensava provir do mundo externo a ele. Porém, uma vez que a dor não se finda com o suicídio, pelo menos não a dor que é expressão da essência da vida, em nada ele