Ricardo Reis
Cada um cumpre o destino que lhe cumpre,
E deseja o destino que deseja; Nem cumpre o que deseja, Nem deseja o que cumpre.
Como as pedras na orla dos canteiros
O Fado nos dispõe, e ali ficamos; Que a Sorte nos fez postos Onde houvemos de sê-lo.
Não tenhamos melhor conhecimento
Do que nos coube que de que nos coube. Cumpramos o que somos. Nada mais nos é dado.
Ricardo Reis, in "Odes"
Análise:
3 quadras;
1os dois versos de cada estrofe são decassílabicos e os dois últimos são hexassílábicos.
A rima, na primeira estrofe é interpolada e emparelhada, e na restantes estrofes é irregular.
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Nos versos 3 e 4, um quiasmo, que destaca o facto de o destino que o ser humano “cumpre” nem sempre ser o que ambiciona.
Nos versos 5 e 6, temos presente uma comparação entre o ser humano e “as pedras na orla dos canteiros” que acentua a imobilidade e a impossibilidade de resistir e contrariar o destino, ou seja, uma carateristica do estoicismo.
As palavras “Fado” e “Sorte” tÊm o significado de Destino. Nos últimos quatro versos, o sujeito poético evidencia a sua resignação ao aceitar o poder do Destino. Assim, cada ser humano deve desistir de ter “melhor conhecimento” do que lhe calhou em sorte na vida e deve limitar-se a consentir com o que lhe coube.
Os dois versos finais (duas frases declarativas) confirmam a abdicação do sujeito poético e a sua anuência voluntária ao Destino, pois este é inelutável. De facto, de acordo com o Estoicismo, o homem não deve lutar contra o Destino, antes cumpri-lo sem o questionar ou se lhe opor. Note-se como, ao longo do poema, a pessoa verbal evolui da terceira do singular (“cumpre”) para a primeira do plural, a partir do verso 6, um «nós» que reflete sobre o destino comum e a condição análoga de todos os humanos sujeitos à ditadura do Destino.
O sujeito poético revela, em suma, o seu conformismo