Resumo Preciosidade
Era uma menina cujos sapatos de madeira faziam estrondoso barulho nos corredores por onde passava. Solitária, magra e feia. Não se cuidava, não tinha vaidade, muito pudica em relação aos homens, se escondia de tudo e de todos, tinha medo de que fizessem ou falassem algo proibido. Sem amigos, sem ambições na vida. Não gostava de ser notada, reparada, ou qualquer coisa semelhante. Seu andar era de quem se esforçava para não chamar atenção, mas algo a impedia disso. Aqueles únicos e barulhentos sapatos de madeira. Apesar de miúda, comia muito, devorava sua refeição e caía no tédio de uma tarde que não terminava, até que sua família retornasse da repartição e transformasse sua casa novamente em um lar.
Um dia, ao sair mais cedo por engano, percebeu que ainda era madrugada e deparou no caminho com dois homens vindo em sentido contrario ao seu, e sentiu quatro mãos que a tocaram contra a sua vontade. E, ao ser tocada, sentiu-se estranha, tranquila e paralisou-se diante de um muro, perdendo a noção do tempo e chegando atrasada à escola.
Mas, então descobriu um novo mundo, ao qual agora ela pertencia. Enfim, foi desejada. Sentiu-se mulher.
De noite, na calma do jantar, em uma explosão de rancor, exigiu sapatos novos, como se a culpa de suas desgraças estivessem no toc toc dos calçados. Alegou que já era mulher e que aqueles sapatos não lhe eram apropriados. Não ousaram negar-lhe.
Agora ela queria ser bonita, aproveitar a vida, ser amada e desejada.