Resenha

DIGNIDADE: UMA QUESTÃO DE GÊNERO?[1]

Maria Emília Lisboa Pacheco[2]

O conceito de gênero é uma inovação política, produzida pelo movimento feminista e suas teóricas, nos anos 90. Um grande êxito do feminismo foi ter conseguido modificar não somente a perspectiva política com que abordava o conflito nas relações mulher-homem, mas também transformar o paradigma utilizado para explicá-lo. O novo conceito de gênero permitiu a compreensão de que não é anatomia que posiciona mulheres e homens em âmbitos e hierarquias distintos, e sim a simbolização feita pelas sociedades . O feminismo desenvolveu esse conceito, propondo-se a revisar como a determinação de gênero assegura a dicotomia na qual se fundamenta a tradição intelectual ocidental (Lamas, 2 000: 13).

O feminismo apontou assim mudanças para a análise social. Não se restringiu a colocar as mulheres como tema, mas recolocou problemas e a forma de abordá-los e resolvê-los. Criticou a visão androcêntrica e tem buscado novos caminhos.

A grande contribuição política do feminismo, é que ele rompeu com as evidências que sustentavam a naturalização das desigualdades entre os sexos, como nos fala Pierre Bourdieu. Este autor adverte que a ordem social masculina está tão profundamente arraigada que não requer sequer a justificação: impõe-se a si mesma como auto-evidente. É considerada “natural”, graças ao acordo que obtém de estruturas sociais, e estruturas cognitivas inscritas nos corpos e nas mentes, traduzidos em esquemas não pensados do pensamento, os habitus. Esses habitus são produto da encarnação da relação de poder que leva a conceituar a relação dominante/dominado como natural ( Bourdieu: 1 999).

Esta significativa mudança produzida pelo movimento feminista está sem dúvida no reconhecimento de que a dominação masculina não se impõe mais como uma evidência de algo indiscutível, contestando mecanismos e instituições encarregados historicamente de