Religião, política e cultura
Joanildo A. Burity
Este artigo se propõe a ser uma metareflexão sobre a construção de uma interrogação quanto ao vínculo entre religião e política na contemporaneidade.
Embora irrecusavelmente sua provocação emerja da circunstância de o autor ser brasileiro, socializado cultural, política e academicamente na conjuntura dos anos de 1980 em diante, a análise não se atém ao contexto brasileiro. Não nego – digo logo – que há algo “biográfico” na construção narrativa e na evolução argumentativa que o texto proporá. Mas quero crer que há algo mais, na pior das hipóteses um testemunho que pode ser tomado como uma posição intelectual ou como um depoimento para interessados na história ou sociologia dos estudos científico-sociais da religião; na melhor, uma proposta de disciplina do olhar e da reflexão para capturar um objeto em reconfiguração – o campo das relações entre religião e política. Enfim, afirmo, rememoro e proponho um caminho de análise para o tema em questão; convoco interlocutores; apresento filiações; sugiro pistas que, me parece, tornam a reflexão proposta um convite a revermos não só nossos cotidianos exercícios de observação do mundo de que participamos, mas também o que outros observadores – de preferência os acadêmicos – estão dizendo a respeito dele.
O texto organiza-se na seguinte seqüência de interrogações, que apresento da forma mais prosaica possível: O que vemos entre religião e política na contemporaneidade? Como nos posicionamos – para ver e em face de que vemos? Que lugar é este, do/no qual vemos?
Religião, política e cultura, pp. 83-113
1. A rigor, apenas recentemente esse plural tem sido admitido, na esteira de certa guinada cultural nas ciências sociais, que permitiu maior atenção a fenômenos que haviam sido simplesmente invisibilizados pelos enfoques macrossocietários e histórico-estruturais herdados do século XIX e da primeira metade do século XX (cf. Nunes,
2002; Mato, 2004;