Raizes de um paradigma indiciário
Melissa Leal da Silva1
1 – A espiritualidade franciscana
Para que se contextualize melhor a espiritualidade franciscana medieval, como a ordem surgiu e se fixou na sociedade, faz-se necessário um retorno no tempo. Mais especificamente, séculos VIII a XII, que precederam o franciscanismo e contribuíram para a mudança da mentalidade que propiciou o seu surgimento.
A espiritualidade da Alta Idade Média foi marcada pelo resgate do Antigo
Testamento como forma de afirmar a hierarquia eclesiástica e obediência ao clero da Igreja. Esse ideal foi apoiado pelos soberanos do poder secular que, nesse momento, ansiavam por ações que ampliassem o seu poder. Segundo André Vauchez, Pepino e Carlos Magno, nesse período deram apoio à Igreja – sendo Carlos Magnos o mais citado, por agir de forma mais significativa, presidindo inclusive Concílios – tornando certas ações obrigatórias, como, por exemplo, abstenção de trabalho aos domingos e obrigatoriedade de pagamento do dízimo.
Nesse momento da Idade Média, o clero foi afirmado como um grupo distinto do restante da sociedade. Pelo fato de que:
[…] Aos olhos dos fiéis, ele parecia como um especialista do sagrado, que se distinguia deles pelo conhecimento que tinha dos ritos e das fórmulas eficazes. [...] Os carolíngios favoreceram a propensão do clero para formar uma casta sacerdotal, separada do resto do povo por suas funções e seu status.
Ainda nessa época, um fato marcante da espiritualidade era o “ritualismo”, presente também na vida dos monges. Segundo Vauchez, o poder secular via nos ritos um meio “indispensável para que o culto divino tivesse todos os seus efeitos salutares”.
A liturgia permaneceu – mesmo que de forma consideravelmente distinta – no seio da Igreja.
No século VIII, era utilizada como forma de distanciar os leigos da celebração do sacrifício de Jesus. Por exemplo, a eucaristia só era dada ao povo