Qualquer coisa
Passava de meia-noite quando tocou meu celular. Isso não era no todo incomum, já que eu era o único investigador do pequeno vilarejo em que vivia.
- Alô? Senhor Miguel Donatello? – disse a voz grave do outro lado da linha.
- Pois não? – respondi.
- Temos um problema no final da rua Três, uma mulher foi assassinada. Sem testemunhas, sem armas na cena do crime e a polícia tem que deixar o local agora, você pode vir aqui?
- Chego em dez minutos.
Vesti-me rapidamente, peguei minha maleta de trabalho e me dirigi a rua três. Quando cheguei, os policias já haviam partido. “Ótimo, nesse meio tempo o assassino teve tempo de mexer na cena do crime.”, ironizei, “E essa é a competência dos policiais daqui”.
Entrei na casa cautelosamente, fiquei com a mão próxima ao quadril de forma que fosse rápido pegar a arma caso precisasse. Aparentemente, o local estava vazio. Fui me aproximando do quando, onde deitada numa cama encontrava-se o corpo da mulher.
Da vitrola no canto do quarto vinha uma música que imediatamente me soou familiar. Eu não a conhecia, e ainda assim tive a certeza de que já tinha escutado. Por um instante, parei pra refletir sobre a música, mas logo voltei ao trabalho. Procurei junto a vitrola alguma marca ou qualquer resquício de que aquele objeto tivesse participado de alguma forma do crime. Nada evidente. Então olhei o corpo da mulher e pulei pra trás de susto.
Veja bem, no meu trabalho é comum eu agir com frieza em relação a cena do crime, ao corpo e tudo mais, como se fossem apenas um quebra cabeça, mas o rosto daquela mulher, aqueles cachos loiros parcialmente cobertos de sangue, aquele rosto angelical ferido, aquele corpo nu que lembrava o de uma deusa das pinturas renascentistas, e agora estava completamente frio, eu já tocara naquele corpo, e já beijara aqueles lábios pelos quais o sangue escorria. Já acariciara aquele cabelo e...
Meu coração disparara quando percebi. Eu era o assassino. As imagens passaram violentamente na