Qual a importância da polis

Vernant começa o capítulo IV (O universo espiritual da pólis) com a ideia de que, com o nascimento da pólis ― isto é, da cidade democrática, organizada a partir de conflitos e negociações entre forças opostas ― o instrumento político por excelência e a chave de toda autoridade no Estado passa a ser a palavra, utilizada na construção dos argumentos. Os gregos chegam a fazer surgir da palavra argumentativa uma divindade: Peithó, a força da persuasão (p. 34). Pois é através da persuasão que se vencem esses confrontos. De termo ritual e fórmula justa, como era sua forma no campo religioso (no primeiro caso) e na linguagem dos primeiros filósofos (no segundo), no processo de aparecimento da democracia a palavra passou a assumir sempre a forma de debate entre contrários, discussão, argumentação. Passou a supor também um público que atua como juiz último nesse conflito. A aceitação pelo voto (braços erguidos) do público quando se diz algo passou a medir a força persuasiva dos discursos, e a dar vitória ao "mais forte" deles. “A arte política é essencialmente esse exercício da linguagem. O logos, na sua origem, toma consciência de si mesmo, de suas regras, de sua eficácia, através de sua função política” ― diz Vernant (p. 35). Historicamente, as análises retóricas e sofísticas do logos como instrumento de poder é que abriram caminho ao levantamento, por Aristóteles, de um saber teórico (e das regras de demonstração) com uma lógica do verdadeiro ― em oposição ao saber “prático” (persuasivo) com sua lógica do provável e do verossímil. Um universo religioso tradicionalmente restrito a círculos aristocráticos vai migrando para a esfera pública na medida em que se populariza, ficando sujeito, pela exposição pública, a críticas e controvérsias. No plano intelectual, essa polarização e publicação se dará pela escrita, agora de domínio público ― e “elemento de base da paideia” (p. 36), isto é, da educação grega. Um universo religioso tradicionalmente restrito a círculos