Puro Efeito
Leda Cartum
da maneira como costumamos perceber o tempo: como se houvesse uma linearidade necessária aos acontecimentos, uma linha que subjaz à continuidade do que vivemos e que desenha a lógica; tudo parece estar costurado por relações de causa e efeito – daí a pergunta constante que nos fazemos: por quê? Qual é a causa deste efeito que sentimos? Costumamos ligar imediatamente aquilo que chamamos de efeito percebido a uma causa anterior que o explique e justifique, que o pontue no tempo e nos permita lidar com ele; costumamos acreditar que tudo o que percebemos como causa nos levará necessariamente a um efeito, e por isso o projetamos a partir da luz que a causa nos dá. Remetemos o presente a um passado, projetamos o presente num futuro, e a partir dessas perspectivas para frente e para trás é possível traçar uma linha no tempo: linha que revela a evolução potencial das coisas no desenrolar de suas consequências; linha que permite adivinhar muitas vezes o que se seguirá, de acordo com o pontilhado que ela imprime no mundo; linha que traça o passado como uma espécie de realidade virtual que atesta a verdade do presente.
Para conceber uma causa a partir de um efeito, é preciso isolar do mundo as coisas que nos interessam e, como num laboratório esterilizado, esquecer que elas fazem parte de uma realidade maior que as cria e contorna: lidar com elas através de um ponto de vista que as cerca, direciona, especifica. Assim, por exemplo: se tropeço em um degrau, caio e me machuco – esse é um efeito e irei em busca da causa que o provocou: posso encontrar uma explicação científica clássica, e dizer que foi a atração gravitacional do planeta Terra que me atraiu para o chão; ou uma explicação psicológica, percebendo que eu estava distraída, com outras coisas na cabeça e não percebi o degrau; uma
62 · Cisma · primeiro semestre 2013
explicação supersticiosa, ao notar que não estava