Portugu s
Machado de Assis
“Gastei trinta dias para ir do Rossio Grande ao coração de Marcela, não já cavalgando o corcel do cego desejo, mas o asno da paciência, a um tempo manhoso e teimoso. Que, em verdade, há dois meios de granjear a vontade das mulheres: o violento, como o touro de Europa, e o insinuativo, como o cisne de Leda e a chuva de ouro de Dânae, três inventos do padre Zeus, que, por estarem fora de moda, aí ficaram trocados no cavalo e no asno. (...) Ocorre-me uma reflexão imoral que é ao mesmo tempo uma correção de estilo. Cuido haver dito, no capítulo XIV, que Marcela morria de amores pelo Xavier. Não morria, vivia. Viver não é a mesma coisa que morrer, assim o afirmam todos os joalheiros desse mundo, gente muito vista na gramática. Bons joalheiros, que seria do amor se não fossem os vossos dixes e fiados?(...) ...Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos.”
Trecho da obra de Aluísio de Azevedo “O Cortiço”
“Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada sete horas de chumbo.” “E naquela terra encharcada e fumegante, naquela umidade quente e lodosa, começou a minhocar, a esfervilhar, a crescer, um mundo, uma coisa viva, uma geração, que parecia brotar espontânea, ali mesmo, daquele lameiro, e multiplicar-se como larvas no esterco.”[...]
Prosa romântica de Fernando Pessoa
A tua voz fala amorosa... Amar-me? Quem o crera? Fala
Tão meiga fala que me esquece Na mesma voz que nada diz
Que é falsa a sua branda prosa. Se és uma música que embala.
Meu coração desentristece. Eu ouço, ignoro, e sou feliz.
Sim, como a música sugere Nem há felicidade falsa,
O que na música não está, Enquanto dura é verdadeira.
Meu coração nada mais quer Que importa o que a verdade exalta
Que a melodia que em