Portoeditora Jdinis Pupsrreitor 1
101214 palavras
405 páginas
As Pupilas doSenhor Reitor
Júlio Dinis
BD
Biblioteca
Digital
Colecção
CLÁSSICOS
DA LITERATURA
PORTUGUESA
As Pupilas do Senhor Reitor Júlio Dinis
pág.
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I
J
osé das Dornas era um lavrador abastado, sadio, e de uma tão feliz disposição de génio, que tudo levava a rir; mas desse rir natural, sincero, e despreocupado que lhe fazia bem, e não do rir dos Demócritos de todos os tempos — rir céptico, forçado, desconsolador, que é mil vezes pior do que o chorar.
Em negócios de lavoura dava, como se costuma dizer, sota e ás ao mais pintado. Até o Sr. Morais Soares teria que aprender com ele. Apesar dos seus sessenta anos, desafiava em robustez e actividade qualquer rapaz de vinte. Era-lhe familiar o canto matinal do galo, e o amanhecer encontrava-o sempre de pé, e em pé o deixava ao esconder-se.
Estas qualidades, juntas a uma longa experiência adquirida à custa de muito sol e muita chuva em campo descoberto, faziam dele um lavrador consumado, o que, diga-se a verdade, era confessado por todos, sem estorvo de malquerenças e murmurações.
Diz-se que — quem mais faz menos merece, e que mais vale quem Deus ajuda do que quem muito madruga, e não sei que mais
— ; será assim; mas desta vez parecia que se desmentira o ditado ou pelo menos que o facto das madrugadas não excluía o auxílio providencial porque José das Dornas prosperava a olhos vistos. Ali por fins de Agosto era um tal entrar de carros de milho pelas portas do quinteiro dentro! S. Miguel mais farto poucos se gabavam de ter.
Que abundância por aquela casa! Ninguém era pobre com ele; louvado Deus!
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As Pupilas do Senhor Reitor Júlio Dinis
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Como homem de família, não havia também que pôr a boca em
José das Dornas. Em perfeita e exemplar harmonia vivera vinte anos com sua mulher, e então, como depois que viuvara, manifestou sempre pelos filhos uma solicitude, não revelada por meiguices
— que lhe não estavam no génio — mas que,