Perspectiva e retrospecto em hugo friedrich
(Link Lírica contemporânea)
I. Perspectiva e retrospecto
Perspectiva da lírica contemporânea: dissonâncias e anormalidade
A lírica européia do século XX não é de fácil acesso. Fala de maneira enigmática e obscura. Mas é de uma produtividade surpreendente. A obra dos líricos alemães, do Rilke dos últimos tempos e de Trakl a G. Benn, dos franceses, de Apollinaire a Saint-John Perse, dos espanhóis, de García Lorca a Guillén, dos italianos, de Palazzeschi a Ungaretti, dos anglo-saxôni-cos, de Yeats a T. S. Eliot, não pode mais ser colocada em dúvida quanto à sua significação. Esta obra mostra que a força de expressão da lírica, na situação espiritual do presente, não é inferior à força de expressão da filosofia, do romance, do teatro, da pintura e da música.
Com estes poetas, o leitor passa por uma experiência que o conduz — também ainda antes que se perceba disto — muito próximo à característica essencial de tal lírica. Sua obscuridade o fascina, na mesma medida em que o desconcerta. A magia de sua palavra e seu sentido de mistério agem profundamente, em-bora a compreensão permaneça desorientada. (...)
Há mais de um século, acumulam-se exemplos de um estilo no qual a dissonância tornou-se autônoma. Transformou-se. em uma coisa em si. E assim sucede que ela nem prepara nem anuncia coisa alguma. A dissonância é tão pouco uma portadora de desordem, assim como a consonância é uma garantia de segurança. Isto é válido em toda a extensão também para a lírica.
(...)
Essa tensão dissonante da poesia moderna exprime-se ainda em outro aspecto. Assim, traços de origem arcaica, mística e oculta, contrastam com uma aguda intelectualidade, a simplici-dade da exposição com a complexidade daquilo que é expresso, o arredondamento lingüístico com a inextricabilidade do conteú-do, a precisão com a absurdidade, a tenuidade do motivo com o mais impetuoso