para maria
A cada vez que você me pronuncia, é o meu coração que dispara. Sem nenhuma vírgula entre uma batida e outra.
E no meio disso tudo, o meu sorriso secreto e solto, voando leve de tão encantado.
Tem que ter um talento e tanto pra insistir em não ser feliz.
A persiana quebrou, o chuveiro queimou, o gás acabou. O dinheiro faz tempo que já não há. E hoje a campanha foi reprovada pela terceira vez. Sinto que alguma coisa muito boa está para acontecer.
Você vai aprender, filho. Que a intensidade pode roubar você de si mesmo. Que é preciso leveza para se pertencer. Você vai aprender a se distrair no meio do caminho – para ter o privilégio de errar. Vai aprender que as descobertas estão nos atalhos. E que é preciso alcançar o escuro denso para estar diante de todas as possibilidades. Você vai aprender a se deitar noite escura e amanhecer ensolarado. E vai entender que na perda mora o verdadeiro começo. Talvez você leve meia vida para isso. Talvez mais, como eu. Mas até lá, olha que sorte: eu vou estar segurando a sua mão.
Você vai fazer dois anos.
E eu não quero voltar no tempo, filho. O meu olhar é para frente porque ali está você. O meu olhar é para mim, porque eu me vejo em você e cresço de novo. Aprendo com a sensação de quem ensina.
Eu agora observo ônibus nas ruas. Se são azuis, verdes ou vermelhos. Se são amarelos, grandes ou pequenos. E me permito definir coisas primárias. Aquele é um caminhão branco, aquele é um ventilador, aquele não, é um lustre. A estrela brilha, a formiga anda, o gatinho mia e, ouve só, é um helicóptero voando. O avião também voa. E o bem-te-vi, que lindo. O mico, não. Vive lá no alto, mas desce pra comer banana da sua mão.
Parece que eu nunca tinha pensado nessas coisas. A borboleta também não se lembra que já foi lagarta. E voa.
Diante do sentido primeiro das coisas, daquele de que me perdi, conto histórias de objetos e já não temo suas razões cruas, seus sem