Os ensaios
No Livro I de Os ensaios, Montaigne nos diz que filosofar é aprender a morrer. No Livro III, já no final da obra, a frase se inverte e ele nos ensina que filosofar é aprender a viver. Mais de quinze anos separam as duas reflexões: a primeira seria de 1571, ano provável do início da redação de Os ensaios, a segunda, de 1588, quando Montaigne incorpora o Livro III a uma nova edição da obra. Aparentemente opostas, as duas afirmações se completam e são uma boa lente de aproximação dessa obra que é lida há mais de quatro séculos e permanece notavelmente moderna. Ler Montaigne (1533-1592) é prazeroso como assistir a uma aula de filosofia a cargo de um professor de vastíssima cultura, que enxerga nos mínimos gestos e pensamentos matéria para reflexão e indagação, mas não pretende ser dono da verdade.
No século XVI eram muitas as acepções de ensaio (essai). Os estudantes usavam o termo para significar o que hoje seriam os exercícios escolares. Aprendizes e artesãos o empregavam para se referir à prova — um protótipo, diríamos — produzida antes da obra definitiva. Nas casas da moeda havia a Essayerie, onde ouro e prata eram experimentados para se descobrir seu teor e valor. Também eram essais as provas que se faziam de uma iguaria ou de um vinho antes de servi-los às mesas dos senhores. O que há em comum entre essas acepções é a noção de tentativa, experiência, portanto, algo sujeito a erros, a aproximações e imperfeições. A Montaigne devemos o significado hoje mais corrente de ensaio como gênero literário em prosa, sem regras fixas, versando sobre