Odisséia
A crítica de todas as épocas reteve sempre que entre a Ilíada e a Odisséia mediou largo tempo, atribuindo a primeira, inegavelmente, superior à segunda, aos anos de maior energia criadora de Homero. A Odisséia, produto dos últimos tempos do Poeta, embora de tão grande valor que outra nenhuma se lhe poderia comparar em toda a literatura clássica, se diferenciava, em muitos pontos, da obra-prima do grande e incomparável cantor da Grécia. Era a Ilíada um poema militar, guerreiro, tendo por escopo principal a narração do que fora essa guerra que terminara com o extermínio de todo um povo, de toda uma cidade, a famosa Ílion. Como devia ser, traz o poema movimentação extraordinária, descrições que nos conservaram as emoções das grandes batalhas travadas entre heróis, tão grandes e tão fora dos moldes humanos que os próprios deuses, como se fossem homens, nelas tomaram parte ativa e decisiva. Tudo na Ilíada respira militarismo, feitos bélicos, devotamentos e sacrifícios heróicos como nunca mais voltaria a raça humana a apresentá-los na face do mundo. O céu e a terra, os homens e os deuses se confundem ou se aproximam grandemente: o Olimpo não é uma região abstrata, colocada simplesmente no alto, no céu, mas uma real montanha da Tessália, posta entre a terra e o céu, porque os deuses deviam estar próximos dos homens e estes daqueles, de tal modo que as qualidades e até os defeitos se comunicassem de uns para os outros. Muito ao contrário, é a Odisséia um poema de paz, uma criação dos tempos posteriores à tremenda ação guerreira de Ílion, quando todo o povo heleno se refazia da grande empresa e vivia para si exclusivamente, voltado para objetivos puramente sociais e domésticos. Os heróis, como navegantes que retornam de suas longas viagens, reúnem-se nas largas salas dos palácios, das casas ricas, dos chefes de valor inconteste, e aí, num ambiente de tranqüilidade, rememoram as vencidas tempestades, os obstáculos superados, e narram, cheios de emoções, as