Nova carta de intenções
Luis Fernando Veríssimo
(Texto de 1983)
Parece que ficou assim a nova carta de intenções do Brasil ao FMI:
“Querido Efe:
Não é preciso dizer que estamos envergonhadíssimos porque não cumprimos nenhuma das promessas da nossa última carta. Sei que você ficou aborrecido conosco e com razão. A Ana Maria (que moça simpática!) esteve aqui e nos passou um pito merecido. Mas depois aceitou nossa explicação técnica para o ocorrido — “O Brasil é assim mesmo”— e na hora de ela embarcar já éramos amigos de novo. Por sinal, você recebeu a goiabada? Bom proveito.
Corre uma história por aqui que achamos que você gostaria de saber. Só como amostra do espírito irreverente do brasileiro. Como você sabe, muita gente aqui diz que a receita do FMI para pôr ordem na economia brasileira é muito ortodoxa e não leva em conta fatores locais. E estão lembrando, como comparação, a história da ajuda soviética aos egípcios, na guerra deles contra Israel. É assim. Você vai dar boas risadas. Israel estava invandindo o Egito e os egípcios não sabiam como se defender. Pensaram, pensaram e decidiram pedir conselhos à Rússia. Afinal, quem entendia mais de expulsar invasores do que a Rússia? Napoleão tinha invadido a Rússia e sido derrotado. Hitler tinha invadido a Rússia e sido derrotado. Pediram ajuda aos russos. Da mesma maneira que o Brasil pediu ajuda ao FMI, certo? Você vai adorar. Não havia tempo para chegar um conselheiro militar russo ao Egito. As consultas tinham que ser feitas por telegrama. E a primeira mensagem dos egípcios foi transmitida:
— Tropas israelenses avançam em nosso território. O que fazer?
Os russos responderam:
— Deixa eles virem.
Mas como? Nenhuma resistência? Nada? Mas os russos entendiam do assunto e os egípcios deixaram os israelenses virem. Segue a segunda mensagem dos egípcios:
— Tropas israelenses continuam avançando nosso território. O que fazer?
— Deixa eles virem.
Os egípcios estranharam, mas aceitaram o conselho. Os russos