A estilista francesa Gabrielle Chanel (1883-1971) é a personagem dos sonhos de qualquer diretor de cinema. Sua trajetória é recheada de sexo, heroísmo e política. Sexo: teve entre seus diversos amantes cabeças coroadas, milionários e mandatários da política, que influenciaram decisivamente sua vida. Heroísmo: emergiu de uma infância pobre para se tornar uma revolucionária do mundo da moda, a primeira mulher a brilhar no ofício de vestir mulheres - exatamente por saber, nesse departamento, o que as mulheres realmente queriam. Política: viveu a época mais dramática do século 20, a das duas guerras mundiais, tendo uma relação perigosamente próxima - e vergonhosamente cooperativa - com os líderes nazistas. No filme Coco antes de Chanel, que entra em cartaz no Brasil neste mês, a diretora Anne Fontaine, nascida em Luxemburgo, desperdiçou personagem tão fascinante. Ela optou por mostrar, na tela, apenas o lado heroico da estilista, ignorando a complexidade da mulher que revolucionou a moda. E deixando de lado o momento mais dramático da vida de sua protagonista, aquele que poderia conferir densidade a seu filme e fazer com que a obra ganhasse relevância: a colaboração de Chanel com o 3o Reich de Adolf Hitler. Gabrielle Chanel - ou Coco, "queridinha", nome que adotara quando cantava em cafés entre os anos de 1905 e 1908 - já era bastante conhecida quando, martelando as botas no famoso passo de ganso, as tropas do Führer cruzaram o Arco do Triunfo, em Paris. Os chapéus, o look masculino, as roupas confortáveis e o famoso "pretinho básico", tudo recendendo ao perfume Chanel no 5, lançado em 1922, a tinham consagrado. Mas foi durante a Segunda Guerra que seu papel chamou a atenção dos historiadores. Foi quando a já famosa estilista ligou-se, como tantos franceses, aos alemães. Tal tipo de ligação ao longo dos anos ficou conhecida como "colaboração".
Chanel passou toda a ocupação no famoso Hotel Ritz, quartel-general dos nazistas em Paris e bem pertinho de sua loja, na rue