Michel foucault
A Possibilidade de conhecimento em Kant: Fenômeno x Noumeno
Retomemos a questão kantiana exposta na primeira parte deste artigo: por quê, afinal, é possível o conhecimento a priori na mecânica de Newton e não na Metafísica ?
Conhecimento a priori significa um tipo de conhecimento que envolve necessidade. Ora, algo é necessário quando sua negação é impossível ou implica contradição. Um exemplo clássico seria o enunciado “o triangulo tem três lados”. Trata-se de um enunciado logicamente necessário porque se eu o nego produzo uma contradição, ou seja, afirmo e nego algo ao mesmo tempo – afirmar que “o triangulo não tem três lados” é afirmar que uma figura de três lados (o triangulo) não tem três lados; figura de três lados, com efeito, é a própria definição de uma triangulo, o que torna a afirmação “o triangulo tem três lados” uma necessidade lógica. Os princípios lógicos não são mais que os princípios da razão pura. Portanto, apoiado exclusivamente na razão pura, eu posso fundar o conhecimento necessário do ponto de vista lógico formal, ou seja, posso produzir um tipo de conhecimento a priori. Entretanto, o conhecimento que a metafísica pretende obter pela razão pura não é um conhecimento necessário do ponto de vista lógico-formal. Deste modo, podemos entender porque a física e a matemática obtêm sucesso onde a metafísica só acumula fracassos: as primeiras estão calcadas no conhecimento lógico-formal, enquanto a segunda não está. Além disso, a ciência físico-matemática é capaz de um conhecimento necessário que se funda também na experiência: a partir de leis necessárias e universais, estas ciências unem experiência e razão e, desse modo, conseguem explicar com segurança seus fenômenos. Não é de se estranhar, portanto, que Kant tenha adotado por tipo de conhecimento o aspecto do conhecimento que se havia tornado familiar à física de Newton: duma parte, uma série de experiências esparsas; doutra, um conceito ou lei que o espírito descobre e que cria a