Mercado Estado e T
Fernando J. Cardim de Carvalho *
1. Introdução
Um velho clichê das ciências sociais em geral, e da teoria econômica em particular, é que a evolução das teorias sociais reflete as preocupações e problemas concretos enfrentados pela sociedade a cada momento. Em economia, a emergência do pensamento keynesiano é dada como o exemplo mais significativo desta quase-tese: a ascensão da teoria da demanda efetiva teria sido o resultado direto da grande depressão da década de 1930; a experiência do desemprego em massa teria levado Keynes a criar uma teoria deste tipo de fenômeno, e o clamor da sociedade por instrumentos de combate à crise explicaria sua ampla aceitação. Menos citada, a onda inflacionária da década de 1960 explicaria o surgimento de Milton Friedman no cenário acadêmico e político-econômico mundial. Afirma-se aquela lei de criação de idéias econômicas, não obstante o fato de Keynes, na redação da Teoria Geral, ter-se apoiado de forma mais visível na experiência inglesa da década de 1920 quando quase todo o resto do mundo ainda vivia um período de euforia do que na de 1930; e não obstante, também, o fato de que Friedman defendia, já na década de 1940 quando a inflação estava longe de se constituir no problema que se tornou posteriormente , idéias muito semelhantes àquelas da década de 1960.
Há, naturalmente, uma influência muito importante dos problemas correntes vividos por uma sociedade na determinação do que se define como um problema relevante teoricamente em economia, mas esta relação está longe de ser tão simples ou mecanicista quanto normalmente se quer supor. O desenvolvimento das idéias se dá, em parte no mínimo tão importante quanto a das influências externas, por força de sua lógica própria, explorando-se potencialidades e incongruências nas teorias dominantes a
*Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Apoio do CNPq é reconhecido com gratidão.
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Mercado, Estado