Matematica
Tinha o olhar perdido num abismo, através do vidro um tanto embaçado da janela à sua frente. Mais parecia uma miniatura daquelas ventanas de torres de castelos medievais, onde se situam os sinos, como de fato remonta o modelo histórico da arquitetura daquela estância. Um lugar infelizmente ainda usado, com algumas reformas, para o funcionamento de um antigo hospital psiquiátrico, agora parte de uma faculdade popular. Numa pequena cela escura repleta de rachaduras, Lucas mantém um rosto sem expressão, qualquer sinal de contemplação ou pensamento. Catatônico e distante. Os olhos negros, opacos, divagam parados na fuga de um turbilhão de emoções e acontecimentos que viram recentemente. Uma fuga num mundo um pouco melhor, onde seu rosto pálido e fino sorria tímida e descontraidamente, num ambiente não mais saudável, mas ao menos agradável. Quase pode ouvir a música de tempos mais reais do que essa loucura que tem sido o mundo. O corpo magro de estatura mediana sob a larga vestimenta bege encardida de interno, a cama ao lado encostada na parede, abaixo de um grande crucifixo de madeira escura e envernizada. Uma bíblia sobre um criado-mudo, os dedos cruzados sobre o colo. Os dentes grandes e certos, cerrados por baixo dos lábios finos, à sombra de um pontiagudo nariz aquilino.
Aquela vista do segundo andar permitia que se pudesse ver um grande jardim mal cuidado à frente de uma quadra poliesportiva, rodeados por uma pista de Cooper, que por sua vez é cercada por muros “brancos” e altos, sujos e rabiscados. Lá deveria haver profissionais conduzindo atividades terapêuticas, mas o que se vê pela neblina desta manhã silenciosa é indigentes abandonados em meio ao lixo. Sentados ou jogados ao chão, fumando, jogando baralho, sendo separados de brigas por “enfermeiros”, enquanto outros andam de um lado para o outro, falando sozinhos. Praticamente mendigos uniformizados, sem família e esperança, num cenário típico onde o clima cinzento, frio e úmido,