Manoel Bandeiras
Desencanto Irene no céu
Eu faço versos como quem chora Irene preta
De desalento...de desencanto... Irene boa
Fecha meu livro se por agora Irene sempre de bom humor.
Não tens motivo nenhum de pranto. Imagino Irene entrando no céu:
Meu verso é sangue. Volúpia ardente... _ Licença, meu branco!
Tristeza esparsa... remorso vão... E São Pedro bonachão:
Dói-me nas veias. Amargo e quente, _ Entra, Irene. Você não precisa
Cai, gota a gota, do coração. [ pedir licença.
E nestes versos de angústia rouca O bicho
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca. Vi ontem um bicho Na imundície do pátio
Eu faço versos como quem morre. Catando comida entre os detritos.
Pneumotórax Quando achava alguma coisa, Não examinava nem cheirava:
Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos. Engolia com voracidade.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse. O bicho não era um cão, Não era um gato,
Mandou chamar o médico: Não era um rato.
_ Diga trinta e três.
_ Trinta e três... trinta e três... trinta e três... O bicho, meu Deus, era um homem.
_ Respire
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_ O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo [e o pulmão direito infiltrado.
_ Então, doutor, não é possível tentar o [ pneumotórax?
_ Não. A única coisa a fazer é tocar um tango [ argentino.
Andorinha
Andorinha lá fora está dizendo:
_ “Passei o dia à toa, à toa!”
Andorinha, andorinha, minha cantiga é mais triste!
Passei a vida à toa, à toa....
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma