machado
A felicidade
— Vem ao seu almoço, não?
— São horas; traga-me hoje duas torradas.
— E o café com leite?
— Que pergunta!
Passava-se este diálogo no Carceller, em uma manhã do ano de 1860, entre um dos caixeiros da casa e um constante freguês que ali se demorava perto de duas horas almoçando e lendo os jornais. O caixeiro não se demorou em servir o freguês; veio a clássica bandeja com o açucareiro, a cafeteira, a leiteira, a xícara, as torradas, os palitos e o guardanapo.
— Agora o Jornal do Commercio.
— Está ocupado.
— E o Diário?
— Também está ocupado.
— Onde está o Jornal?
— Tem-no aquele sujeito de gravata amarela.
O freguês resignou-se e começou a almoçar dividindo a sua atenção entre as torradas e o sujeito da gravata amarela. Posto que muitas vezes se desse aquele inconveniente de já estar ocupado o Jornal do Commercio, o nosso homem parecia extremamente irritado, e a um observador fino não seria difícil conhecer que ele tinha um sistema nervoso de fácil irritação.
Com a irritação de um contrastava a tranqüilidade do outro. O leitor da gravata amarela tinha a calma natural que a posse inspira ao homem. Já havia engolido o almoço, tinha entre os dentes um alvíssimo palito cuja ponta mastigava, cruzara as pernas, encostara-se à parede e lia voluptuosamente os a pedido da folha. Era um destes homens que lêem tudo e não lêem nada; percorria os primeiros períodos de um artigo, ia ler os últimos, voltava aos primeiros, passava a outro artigo, virava e revirava a folha, como se não houvesse para ele nenhuma outra ocupação. Algumas vezes parecia disposto a deitar a folha sobre a mesa, e o outro que o espreitava, ia-se levantando para a ir buscar com medo que outro pretendente adiantasse a mão. Engano! O sujeito da gravata amarela não concluía o gesto e continuava a ler tranqüilamente, como se fosse o único assinante daquele exemplar.
Durante esta longa leitura, entremeada de negaças sem