literatura
Emília não tinha rivais, não me disputava a ninguém; dominava-me na soberania de sua beleza, e atraía-me ou arredava-me a seu bel-prazer, com um cenho apenas da sua graciosa majestade.
Eu era para essa moça como um vaso onde ela guardava as essências de sua alma para mais tarde aspirar-lhes o perfume. Quando chegavam as horas dessa afluência do coração, ela procurava-me para vazá-la em mim: a sua palavra ardente abundava então do lábio vívido. Outros dias chegava-se muda e absorta; parecia haver dentro dela uma grande solidão, onde seu espírito se perdia.
¾ Diga-me alguma coisa! murmurava ela. ¾ Fale-me... Fale do céu, das nuvens, do mar, do que Deus criou de melhor neste mundo!...
E eu falava; e ela bebia as minhas palavras, que lhe matavam a sede d'alma.
Fora desses momentos, em que sua alma sentia uma necessidade irresistível de expansão ou de absorção, ela parecia esquecer-me.
Foi por este tempo que eu tomei uma grande resolução. Afagara sempre a idéia de ter uma pequena chácara onde me refugiasse às tardes, escapando ao burburinho da cidade.
Aproveitei esse pretexto para aproximar-me de Emília. Indo visitá-la um dia, vi com escritos uma casinha pendurada na aba da montanha, perto de sua chácara. Dali descortinava-se o seu jardim, o terraço e as janelas dos aposentos que ela ocupava na face esquerda do edifício. Com um óculo de alcance eu poderia vê-la a cada momento.
Alugada a casa, assaltou-me o receio de desagradar-lhe. Sabia eu se era amado? E quando o fosse já, a imprudência que ia cometer não assustaria uma afeição nascente?
¾ Não importa!