Lele
Eu trabalhava em um jornal popular como repórter de polícia. Há muito tempo não acontecia na cidade um crime interessante envolvendo uma rica e linda jovem da sociedade, mortes, desaparecimentos, corrupção, mentiras, sexo, ambição, dinheiro, violência, escândalo. - Crime assim nem em Roma, Paris, Nova York, - dizia o editor do jornal, estamos numa fase ruim. Mas daqui a pouco isso vira. A coisa é cíclica, quando a gente menos espera estoura um daqueles escândalos que dá matéria para um ano. Está tudo podre, no ponto, é só esperar. Antes de estourar me mandaram embora. Só tem pequeno comerciante matando sócio, pequeno bandido matando pequeno comerciante, polícia matando pequeno bandido. Coisas pequenas, - eu disse a Oswaldo Peçanha, editor-chefe e proprietário do jornal Mulher. - Tem também meningite, esquistossomose, doença de Chagas, - disse Peçanha. - Mas fora da minha área, - eu disse. - Você já leu Mulher? - Peçanha perguntou. - Admiti que não. Gosto mais de ler livros. Peçanha tirou uma caixa de charutos de dentro da gaveta e me ofereceu um. Acendemos os charutos. Em pouco tempo o ambiente ficou irrespirável. Os charutos eram ordinários, estávamos no verão, de janelas fechadas, e o aparelho de ar condicionado não funcionava bem. - Mulher não é uma dessas publicações coloridas para burguesas que fazem regime. E feita para a mulher da classe C, que come arroz com feijão e se ficar gorda azar o dela. Dá uma olhada. Peçanha jogou na minha frente um exemplar do jornal. Formato de tablóide, manchetes em azul, algumas fotos fora de foco. Fotonovela, horóscopo, entrevistas com artistas da televisão, corte-e-costura. - Você acha que poderia fazer a seção De Mulher para Mulher, O nosso consultório sentimental? O cara que fazia se despediu. De Mulher para Mulher era assinado por uma tal Elisa Gabriela. Querida Elisa Gabriela, meu marido chega toda noite embriagado e... - Acho que posso, - eu disse. Ótimo. Começa hoje. Que nome você