Lavínia Simões
O NEGRO: Por favor.
LIZZIE: Que é que você está querendo? Dinheiro?
O NEGRO: Não, senhora. (Pausa). Por favor, diga a ele que eu não fiz nada.
LIZZIE: Dizer a quem?
O NEGRO: Ao juiz. Diga, dona. Por favor, diga a ele.
LIZZIE: Não direi absolutamente nada.
O NEGRO: Por favor.
LIZZIE: De jeito nenhum. Já tenho problemas suficientes na minha própria vida, para ter de, ainda por cima, agüentar os dos outros. Vá embora.
O NEGRO: A senhora sabe que eu não fiz nada. Eu fiz alguma coisa?
LIZZIE: Não, você não fez nada. Mas eu não vou atrás do juiz. Tenho nojo de juizes e tiras.
O NEGRO: Deixei minha mulher e os meus filhos e andei em círculos a noite inteira. Não agüento mais.
LIZZIE: Saia da cidade.
2
O NEGRO: Eles estão vigiando as estações.
LIZZIE: Quem está vigiando?
O NEGRO: Os brancos.
LIZZIE: Que brancos?
O NEGRO: Todos os brancos. A senhora não saiu hoje de manhã?
LIZZIE: Não.
O NEGRO: A rua está cheia de gente. Jovens e velhos; conversam mesmo sem se conhecerem.
LIZZIE: Que é que você está querendo dizer?
O NEGRO: Que só me resta correr em círculos até que me apanhem. Quando os brancos que não se conhecem começam a conversar entre si, é sinal de que um negro vai morrer. (Pausa). Diga que eu não fiz nada, dona. Diga ao juiz; diga ao pessoal do jornal. Talvez eles imprimam. Diga, dona, diga! Diga!
LIZZIE: Direi.
O NEGRO: Jura por Deus?
LIZZIE: Ah, vá se danar! Estou prometendo e basta. (Pausa). Agora vá embora! Anda!
O NEGRO: (Bruscamente) Por favor, me esconda.
LIZZIE: Esconder você?
O NEGRO: A senhora não quer, dona? Não quer?
LIZZIE: Esconder você? Eu?
NARRADOR: (Ela lhe bate com a porta na cara).
LIZZIE: Chega de história. (Vira-se para o banheiro). Pode sair.
NARRADOR: Fred sai em manga de camisa, sem colarinho nem gravata.
CENA 2
LIZZIE, FRED
FRED: Que foi?
LIZZIE: Nada.
FRED: Pensei que era a polícia.
LIZZIE: A polícia? Você tem alguma coisa