Intervenções sobre o patrimônio urbano: modelos e perspectivas
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Intervenções sobre o patrimônio urbano: modelos e perspectivas
Leonardo Barci Castriota
NPGAU/EAUFMG
Em 1986, Carlos Nelson Ferreira dos Santos, em seu artigo “Preservar não é tombar, renovar não é pôr tudo abaixo”, sistematizava, de forma pioneira, os impasses vividos pelas políticas do patrimônio no Brasil:
Do jeito que vem sendo praticada, a preservação é um estatuto que consegue desagradar a todos: o governo fica responsável por bens que não pode ou não quer conservar; os proprietários se irritam contra as proibições, nos seus termos injustos, de uso pleno de um direito; o público porque, com enorme bom senso, não consegue entender a manutenção de alguns pardieiros, enquanto assiste à demolição inexorável e pouco inteligente de ambientes significativos.1
Não há como contestar a atualidade desse texto, cujas afirmações poderiam, sem maiores problemas, ser dirigidas ainda hoje ao estado das políticas de patrimônio no Brasil, perdidas entre discursos que incorporam novidades e modismos em voga no exterior e práticas muitas vezes regressivas, que repetem, sem crítica, procedimentos em curso desde os anos 30. Grande parte dessas dificuldades derivam, a nosso ver, de um duplo impasse: a não absorção real no país do conceito contemporâneo e ampliado do patrimônio e a decorrente indefinição acerca do tipo de intervenção a ser exercida sobre os bens culturais. É neste sentido que este artigo propõe-se a discutir, ainda que de forma preliminar, essas duas questões, relacionando as dimensões teórica e prática envolvidas nas políticas de patrimônio. Assim, tentaremos, por um lado, focalizar a extraordinária ampliação que esse conceito sofre especialmente nas últimas décadas do século XX; por outro lado, vamos discutir as questões colocadas por essa ampliação para a gestão do patrimônio, que se relacionam com o próprio modelo jurídico-administrativo a se utilizar. Para isso, numa tentativa de estabelecer certas distinções que nos