Filosofia
Págs. 259-284, ISSN: 0034-8341 doi:10.3989/revindias.2011.010 ABOLIÇÃO NO BRASIL: RESISTÉNCIA ESCRAVA,
INTELECTUAIS E POLÍTICA (1870-1888)
POR
RICARDO SALLES
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro-UniRio
A Abolição da Escravidão no Brasil coloca as seguintes questões históricas: qual o caráter social do abolicionismo? Qual seu sentido histórico? Foi uma revolução ou apenas um lance na transição para o capitalismo no país? Que interesses defendia o movimento abolicionista? Que grupos sociais protagonizaram o movimento? Qual o papel dos escravos no processo? O que defendiam e quem representavam os intelectuais abolicionistas? São estas indagações que guiam esse artigo no sentido de pensar a relação entre o lugar dos intelectuais abolicionistas e as possibilidades e os limites de formação, ou o «acontecimento» da população escrava e liberta enquanto uma classe nacional no período final da escravidão no Brasil.
PALAVRAS CHAVE: Segunda escravidão, abolicionismo, Brasil, intelectuais, classes sociais.
O Brasil —trata-se de um lugar comum que nunca é demais repetir— foi o último país ocidental a abolir a escravidão, e não sem muita luta e pressão.
Não se pode e não se deve separar a história da abolição no Brasil da história da abolição no mundo atlântico, iniciada praticamente um século antes. A distância de cerca de um século a separar as lutas pela extinção do tráfico internacional de escravos na Inglaterra e a abolição em São Domingos, em fins do século XVIII, e a abolição no Brasil não se deve, contudo, a um atraso de adaptação do país aos tempos modernos. A escravidão brasileira —e também a norte-americana e a cubana— do século XIX foi, antes de tudo, criação e criadora da modernidade contemporânea do sistema-mundo dominado pelo advento do capitalismo industrial. Como tal, e assim como este, conviveu, desde seu despertar, com forte e crescente oposição social e mesmo contestação