Filosofia
A experiência da história numa era de expectativas decrescentes
Paulo Eduardo Arantes
1.
World Time
Costuma-se atribuir a origem da expressão world time a um livro de assunto um tanto remoto — conflitos sociais na China medieval —, Conquerors and Rulers, de Wolfram Eberhard1. Em sua acepção de estréia no repertório historiográfico, tal conceito sugeria a existência de algo como um clima internacional, suficientemente persuasivo para influenciar escolhas sociais e decisões políticas em arenas locais mais restritas. Fosse outro o “tempo do mundo”, a dose de brutalidade implicada na decolagem econômica do Japão, em fins do século XIX, por exemplo, não se beneficiaria do “clima” mundial que de certo modo a favoreceu2. Subsidiariamente, uma questão de método: a idéia de um “tempo mundial” cortaria pela raiz a tentação de comparações excessivas entre períodos ou experiências históricas particularmente afastados uns dos outros, não obstante analogias estruturais à primeira vista irrecusáveis. Em suma, um demarcador de época que permite comparar e se comparar3. Por este fio comparatista puxará Immanuel Wallerstein, ao mencionar de passagem o conceito e seu autor na “Introdução” do primeiro volume do Modern World-System. A seu ver, o que Wolfram Eberhard batizara de world time nada mais era do que o contexto mundial de uma época determinada, de sorte que, num exemplo nem tão a esmo assim, França do século XVII e Índia do século XX, mesmo compartilhando certas características estruturais, permaneciam no entanto incomparáveis na medida em que os respectivos contextos mundiais não poderiam ser mais distantes4. A distinção era menos corriqueira do que parece: a noção de “tempo mundial” permitia contornar o absurdo de comparar incomparáveis, evitando igualmente as ciladas comparatistas armadas pelo ponto de vistas das “modernizações”, das “defasagens”, etc. Tratava-se afinal de aproximar ou afastar industrializações, revoluções, etc,