Fichamento Fernando Pessoa torna-se o mais influenciador dos poetas modernos. Esta generalização tardia e súbita da sua influência significa, plausivelmente, que a sua obra apreendeu certas inquietações e ansiedades numa altura em que elas passavam despercebidas, porque ainda se fingia acreditar em certos valores ou sentimentos de expressão poética, em certos ideais ou emoções retoricamente caritativos ou cívicos que, no fundo, se haviam esvaziado de qualquer autenticidade. Com efeito, os heterônimos são uma invenção nova na lírica européia, embora já inerente à tradição dramática. O heterônimo Alberto Caeiro reage em verso prosaicamente livre contra o transcendentalismo saudosista. O heterônimo Ricardo Reis exprime, contra aspirações de sobrevivência post mortem ou de progresso humano, e em estilo que pelas formas estróficas e loci communes clássicos pode parecer neo-arcádico, a antiga sabedoria epicurista egocêntrica, que se reduz à estimativa e opção astuta entre dores e prazeres prováveis, num mundo que tanto faz considerar dominado pelos fatos inelutáveis como por um jogo de4 forças transcendentes ao nosso conhecimento. O heterônimo Álvaro Campos, pelo contrário, prega nas odes em verso livre entusiástico, à maneira de Walt Whitman, a sabedoria futurista da sem-razão, da energia mecânica, da vida jogada por aposta; ou então o anseio, mais whitmaniano ou sensacionalista, de “sentir tudo de todas as maneiras.”. A assinatura Fernando Pessoa, em oposição ao normalmente extrovertido Álvaro de Campos, formula, em redondilhas rimadas à tradicional maneira portuguesa. Ora, estas atitudes fundamentais de cada heterônimo desdobram-se, por seu turno, em paradoxos insanáveis. Na ficção de interlúdio que é cada um deles. Pessoa apreende, assim, todo um conjunto de vivências, intuições, em pleno conflito. A explícita carga inquisitiva da sua poesia é inesgotável, e seria necessário ir a camões para encontrarmos na literatura um porta comparável sob este