Festas religiosas
PETER BURKE
A ESCRITA DA HISTÓRIA
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Um segundo ataque à história dos acontecimentos ocorreu no início do século vinte. Na Grã-Bretanha, Lewis Namier e R.H. Tawney, que concordavam em algo mais, sugeriram quase ao mesmo tempo que o historiador, em vez de narrar os acontecimentos, deveria analisar as estruturas. Na França, a rejeição do que era pejorativamente chamado de "história dos acontecimentos" (histoi-re événementieííe), em prol da história das estruturas, era uma prancha importante na plataforma da chamada "escola dos Anna-les", de Lucien Febvre a Fernand Braudel, que, da mesma forma que Millar, encaravam os acontecimentos como a superfície do oceano da história, significativos apenas por aquilo que podiam revelar das correntes mais profundas.3 Se a história popular permanecesse fiel à tradição da narrativa, a história académica tornar-se-ia cada vez mais preocupada com os problemas e com as estruturas. O filósofo francês Paul Ricoeur certamente tem razão, quando fala do "eclipse" da narrativa histórica em nosso tempo.4
Ricoeur prossegue declarando que toda a história escrita, incluindo a chamada história "estrutural" associada a Braudel, necessariamente assume algum tipo de forma narrativa. De um modo similar, Jean-François Lyotard descreveu algumas interpretações da história, especialmente aquela dos marxistas, como "grandes narrativas".5 O problema de tais caracterizações, pelo menos para mim, é que elas diluem o conceito da narrativa, até que ela corra o risco de se tornar indistinguível da descrição e da análise.
Entretando, não vou tratar desse assunto aqui, preferindo concentrar-me na questão mais concreta das diferenças, no que poderia ser chamado de o grau de narrativa, entre algumas obras contemporâneas de história e outras. De alguns anos para cá tem havido sinais de que a narrativa histórica, em um sentido bem
3. F. Braudel, The Mediterranean, 2 ed. rev., trad. S. Reynolds, Londres, 1972-3, prefácio.
4. P.