Entrevista Adorno
AO MANTER-SE COMO TEORIA” *
ENTREVISTA DE T. ADORNO
Spiegel: Senhor professor, há duas semanas o mundo ainda parecia em ordem...
Adorno: Não para mim.
Spiegel: ... O senhor dizia que sua relação com os estudantes não foi afetada. Nas suas atividades de ensino haveria debates fecundos e objetivos, sem perturbações privadas. No entanto, agora o senhor suspendeu suas aulas.
Adorno: Não as suspendi por todo o semestre, só temporariamente. Em algumas semanas pretendo retomá-las. É o que todos os colegas fazem quando há invasões de salas.
Spiegel: Houve violência contra o senhor?
Adorno: Não violência física, mas fizeram tanto barulho que a aula tornou-se impraticável. Isso claramente foi planejado.
Spiegel: O senhor sente-se incomodado apenas pela forma como agora o atacam os estudantes – que antes o apoiavam – ou também o incomodam os objetivos políticos? Afinal, antes havia concordância entre o senhor e os rebeldes.
Adorno: Não é nessa dimensão que estão em jogo as divergências. Há dias declarei numa entrevista à televisão que, embora eu tivesse elaborado um modelo teórico, não poderia ter imaginado que as pessoas quisessem realizá-lo com bombas. Essa frase foi citada inúmeras vezes, mas necessita muito de interpretação.
* “Die Philosophie ändert, indem sie Theorie bleibt. Gespräch mit Theodor W. Adorno”.
Entrevista à revista Der Spiegel, n.o 19, 1969. Tradução de Gabriel Cohn. Publicado anteriormente no Caderno “Mais!” da Folha de S. Paulo, 31.08.2003.
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LUANOVA Nº 60— 2003
Spiegel: Como o senhor a interpretaria hoje?
Adorno: Jamais ofereci em meus escritos um modelo para quaisquer condutas ou quaisquer ações. Sou um homem teórico, que sente o pensamento teórico como extraordinariamente próximo de suas intenções artísticas. Não é agora que eu me afastei da prática, meu pensamento sempre esteve numa relação muito indireta com a prática. Talvez ele tenha tido efeitos práticos em conseqüência de alguns