Entre meninos e vaqueiros

ENTRE MENINOS E
(memórias

VAQUEIROS a invenção

mineiras para narrativa)

Marília Rothier Cardoso
PUC-Rio

RESUMO
A partir dos documentos de trabalho de Guimarães Rosa, este artigo explora as implicações entre memória e a construção de paisagens literárias em sua obra, sublinhando o quanto a difusão de imagens do próprio autor, como as da expedição de 1952, afeta de modo inevitável nossa leitura contemporânea.

PALAVRAS-CHAVE
Guimarães Rosa. Memória. Arquivos literários. Imagens.

O público costuma identificar os escritores – especialmente aqueles destacados como referência cultural – a algumas de suas imagens registradas e frequentemente repetidas pela mídia. De Guimarães Rosa, sempre nos lembramos como o viajante pelas trilhas do sertão. Fotografado a cavalo, entre vaqueiros, ele surge – para o resgate ou o descarte das novas gerações – como avalista da preservação mítica de antigos saberes e usos rurais. A fotografia, a que me refiro, foi tirada pelo repórter da revista O Cruzeiro em 1952, quando Rosa, numa de suas excursões de pesquisa com fins literários, acompanhou uma boiada entre a fazenda da Sirga e a de São Francisco, próxima a Cordisburgo. Se o legado importante dessa viagem emblemática foram as novelas e o longo relato de Riobaldo, publicados em 1956, ficou também – para nós, curiosos sobre a construção das estórias – uma herança mais reservada e particular: as cadernetas de campo e as inúmeras folhas de “estudos para a obra”, que compõem o arquivo do escritor. Se, nos meados do século XX, o artista se deixa retratar em meio à vegetação do cerrado, testemunhando uma atividade artesanal em vias de extinguir-se, pode-se considerá-lo menos um observador nostálgico e mais um militante empenhado na tarefa de intervir criticamente sobre os rumos da onda iminente de modernização urbanizadora. Embora seu papel se assemelhe ao do memorialista, ocupado com a preservação museográfica de paisagens e costumes do passado, a força inventiva do