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No ano de 1944, uma jovem autora fez sua estréia na Literatura Brasileira com um título que lembrava um verso poético: Perto do Coração Selvagem. A autora em questão, com o passar dos tempos, transformou-se em uma das mais cultuadas escritoras brasileiras, utilizando-se de seu próprio nome, que aos olhos do crítico Sérgio Milliet parecia um pseudônimo: Clarice Lispector.Logo de início, alguns críticos se aperceberam de uma característica especial de sua obra.
Sérgio Milliet, através da série de volumes de seu Diário Crítico, fornece um dos primeiros documentos críticos importantes acerca da produção literária de Lispector. Milliet , escrevendo sobre Perto do Coração Selvagem, confessa que, inicialmente, não havia dado grande importância à obra e já ia atirá-la de lado, quando resolveu ler uma página ao acaso. A escolhida foi a de número 160 e causou tal impressão no crítico que o convenceu a ler a obra inteira. Nessa leitura, ele se depara com uma linguagem que envereda por atalhos inesperados e atinge o poético. Clarice possui a capacidade ou dom de associar um conteúdo inesperado às palavras, dando-lhes vida própria. Para o autor, essa característica é típica da poesia.Outro crítico, Álvaro Lins (1963, p. 186-193), no artigo “A experiência incompleta: Clarisse Lispector”, incluído em seu livro Os mortos de sobrecasaca, ainda que considere os livros já lançados da autora, Perto do Coração Selvagem e O Lustre, como obras “inacabadas”, reconhece nela a capacidade de mesclar o mundo real com outro da psicologia, do sonho e da imaginação, eliminando as fronteiras que os dividem. Em síntese, Clarice realiza uma união entre o realismo e o lirismo. Para realizar essa ligação, ela, muitas vezes, lança mão dos recursos da poesia, o que é alvo de uma séria reprimenda do estudioso, que julga que tal escolha faz com que perca seu contato com a terra, com o gênero humano. É fácil compreender esse juízo de Lins, quando se