Dragão Mago é muito forte.
O sentido da novidade na
Carta de Pêro
Vaz de Caminha
LUÍS ADÃO DA
FONSECA é professor da
Universidade do Porto.
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REVISTA USP, São Paulo, n.45, p. 38-47, março/maio 2000
M
uito se tem escrito sobre a Carta de Cami-
nha. Neste sentido, sem pretender apresentar uma nova leitura da célebre epístola, gostaria de proceder a uma breve reflexão sobre um aspecto muito concreto – o sentido da novidade na Carta (1).
As fontes contemporâneas são, a este respeito, claras:
sobressai o espanto perante uma terra, uma geografia e uma humanidade, impensáveis antes de abril de 1500. Como escreve Bartolomeu Marchioni, o mercador florentino que tinha parcialmente financiado uma das embarcações da frota de Cabral, trata-se de “um novo mundo”, onde
“é perigoso navegar”. Os portugueses – acrescenta – “trouxeram muitas espécies de aves e animais de nós desconhecidos e jamais vistos, à maneira daquelas coisas que contava Plínio nas suas histórias. Eram consideradas mentirosas, e, pelo que hoje se vê, pode-se dizer que tinha qualquer verdade” (2).
Em certa medida, este espanto é natural. Num primeiro momento, o homem europeu – culturalmente preparado para projectar uma realidade insular a poente do oceano (3) – tem dúvidas sobre a verdadeira dimensão destas novas terras (tanto as descobertas por Colombo como as achadas por Cabral); o assunto constituirá mesmo matéria de debate (4).
Vejamos o que nos diz a Carta de Caminha. O seu conteúdo é abundantemente conhecido; a aproximação à costa, os primeiros contactos com os indígenas – fáceis e pacíficos –, as dificuldades de entendimento. É nesse momento, e sobretudo quando um dos pilotos recolhe dois índios e os leva junto do capitão – momento em que tem lugar a primeira tentativa de identificação dos naturais –, que a novidade surge com um sentido reforçado.
Já antes Caminha escrevera serem os indígenas “pardos, todos nus, sem nenhuma coisa que lhes cobrisse suas