Divisão da natureza
Da Divisão da Natureza
Nicola Abbagnano — História da Filosofia
Análise do Tratado de Erígena Da Divisão da Natureza''
Fé e Razão
O pressuposto da investigação de João Escoto é o acordo intrínseco entre razão e fé; entre a verdade a que chega a livre investigação e a que é revelada ao homem pela autoridade dos Livros Sagrados e dos escritores iluminados. «Não há salvação para as almas dos fiéis se não em crer no que se diz com verdade sobre o único princípio das coisas, e em entender o que com verdade se crê» (De div. nat., II, 20). A autoridade das Sagradas Escrituras é indubitavelmente indispensável ao homem, porque só elas podem conduzi-lo aos lugares secretos em que reside a verdade (I, 64). Mas o peso da autoridade não deve, de forma alguma, afastá-lo daquilo que a reta razão o persuada. «A verdadeira autoridade não cria obstáculos à reta razão, nem a reta razão cria obstáculos à autoridade. Não há dúvida de que ambas dimanam de uma fonte única, isto é, da sabedoria divina» (I, 66). Mas a dignidade maior e a prioridade danatureza correspondem à razão, e não à autoridade. A razão nasceu no princípio dos tempos, juntamente com a natureza: a autoridade nasceu depois. A autoridade deve ser aprovada pela razão, de contrário poderá não parecer sólida: a razão não precisa de ser apoiada ou corroborada por qualquer autoridade. Em suma, a própria autoridade nasce da razão, porque a verdadeira autoridade não é mais que a verdade descoberta pela razão dos Santos Padres e por eles transmitidas por escrito em benefício da posteridade (I, 69). E João Escoto coloca na boca do mestre, que é o principal interlocutor do diálogo, um enérgico convite à livre investigação: «Devemos seguir a razão que procura a verdade e não está oprimida por qualquer autoridade e que de nenhuma maneira pode impedir que seja publicamente exposto e difundido aquilo que os filósofos procuram assiduamente e com dificuldade conseguem encontrar»