Cá nesta Babilónia
Cá nesta Babilónia, donde mana
Matéria a quanto mal o mundo cria;
Cá, onde o puro Amor não tem valia,
Que a Mãe, que manda mais, tudo profana;
Cá, onde o mal se afina, o bem se dana,
E pode mais que a honra a tirania;
Cá, onde a errada e cega Monarquia
Cuida que um nome vão a Deus engana;
Cá, neste labirinto, onde a Nobreza,
O Valor e o Saber pedindo vão
Às portas da Cobiça e da Vileza;
Cá, neste escuro caos de confusão,
Cumprindo o curso estou da natureza.
Vê se me esquecerei de ti, Sião!
Luís Vaz de Camões, in "Sonetos"
Influência da Filosofia Platónica
Platão concebeu dois mundos: um sensível e um inteligível. A vida do homem no mundo era a de um prisioneiro ou desterrado que apenas via as sombras da verdadeira realidade que um dia contemplou no mundo inteligível.
Pela reminiscência (espécie de recordação ) lembrava-se do mundo das ideias donde descendeu.
Camões recorre ás influências de Platão para considerar a terra de exílio como o lugar de sofrimento e de recordação da sua verdadeira Pátria, simbolizada por Sião.
Discurso
Literário pelo seu valor conotativo e sugestivo, o discurso permite que os significantes adquiram significados, obrigando à interpretação e à reflexão.
É característico do texto lírico, enquanto o sujeito de enunciação nos dá conta dos seus sentimentos e emoções, revelando o seu estado espírito. O mundo interior do sujeito poético e o interiorização da realidade exterior surgem nos juízos de valor, ao fazer a caracterização de Babilónia, e na utilização da primeira pessoa verso 13.
Estrutura externa
Soneto composto de duas quadras e de dois tercetos; versos decassilábicos; esquema rimático abba / abba / cdc / dcd , com rima interpolada e emparelhada nas quadras e cruzada nos tercetos ; quanto á acentuação, é grave (feminina). Com excepção dos versos 10, 12 e 14 em que é aguda (masculino); rima pobre, consoante