Cultura
Basta entrar em qualquer grande organização para logo ser assaltado por uma presença informe. Paira no ar um mistério que faz as vezes de esfinge e que sugere, no silêncio de sua carranca, a famosa frase: “decifra-me ou te devoro”. A arquitetura do ambiente, os móveis e os quadros embutem algo que os gestos desenham. As cores, os movimentos do pessoal e os equipamentos evocam o que as palavras celebram. E, de forma curiosa, os agentes individuais, habitualmente tão diversos entre si, assemelham-se nos ritmos e jeitos. O ar parece vibrar, impregnado por sutis reverências e por conteúdos furtivos, por mil cumplicidades que códigos e jargões disfarçam. Para não dar um mau passo, o recém-chegado mantém-se alerta: desliza com prudência minuciosa; procura captar significados nas entrelinhas; mede e compara silêncios e posturas; pouco se atreve a dar notícia de si, para não destoar; sabe-se estranho, forasteiro, outro- tal qual um imigrante; pisa em ovos, cheio de dedos e mesuras; move-se nos limites das boas maneiras; escuda-se nas idéias recebidas do senso comum.
Em contrapartida, quem pertence à organização oficia como um iniciado, pois tudo lhe soa trivial: reconhece os suportes e as reticências de cada ato; decodifica os antecedentes e as omissões e cada fala; ensaia rito após rito, com segura intimidade; divisa as saliências do terreno e os riscos de cada curva; pressente as máscaras que se improvisam; e atina as táticas ocultas.
Em princípio, o recém-chegado não deveria sofrer embaraço algum. Afinal, mora no país, domina a língua, partilha os costumes, não nasceu ontem. Mas o temor do desconhecido instala-se nele, sorrateiro, para logo tornar-se avassalador. Chega a desconfiar que está diante de algo intangível, de uma presença suprema que flui como seiva os desvãos da organização. De tão onipresente, aliás, esta presença imaterial não costuma reter a atenção do pessoal da casa, pois é natural como o ar que se respira. Para quem vem