Corpos modificados - edvaldo couto souza
No reino das interfaces dos corpos, das sexualidades e das tecnologias digitais, dos prazeres triunfantes, os resíduos corporais e de gozo dos anacrônicos e simples humanos formam, ainda, imensos batalhões. As políticas do pós-humano com suas promessas de felicidade erótica não excluem as múltiplas manifestações de misérias corporais e sexuais que, para desgosto de muito, ainda persistem. Somos todos ciborgues. Mas nem todos da mesma maneira. Uns são bem defasados, com diversos prazos de validade vencidos, outros mais atualizados, aperfeiçoados pelas tecnologias de última geração. Somos todos pós-humanos, mas em sintonias e conexões diferentes, em estágios diversos de construção corporal. Somos todos transexuais, pós-sexuais, além do sexo, mas em diferentes graus de interações e conectividades. Os anúncios de gozos intermináveis também se Confundem e revelam as muitas contradições e misérias de sistemas que se pretendem puros, mas que são contaminados por realidades múltiplas e distintas. Tudo é confuso, contraditório e paradoxal porque está em projeto. Nada está pronto, construído, finalizado. Estamos todos sempre em processo, entre retrocessos e avanços que se esbarram em renovados limites e barreiras pessoais, educacionais, culturais e tecnológicas que não cessam de nos desafiar. A fé otimista nos corpos ciborgues, no destino pós-humano e nas sexualidades potencializadas pelas próteses cirúrgicas ou químicas, conectadas em ambientes digitais e em circulação sideral nas redes sociais eletrônicas, também tem seu lado satânico, devastador. Ela também se confunde com renovadas insatisfações, fragilidades, inquietações e desencantamentos. Desvendado e redesenhado de inúmeras maneiras, o corpo tecnológico não é objeto de consenso. As políticas do pós-humano são essencialmente inquietantes e despertam as mais diversas e complexas paixões.
Estamos, pois, diante de fecundos desafios