clara dos anjos
Poder se sobrepõe a lei
Nas páginas da obra, Lima Barreto resgata e coloca à mostra o senhorzinho de escravos, desta vez como um homem da classe burguesa, que, mesmo após o advento da libertação dos negros, continua a suplantá-los, banqueteia-se dos corpos das mulatas e, em decorrência de influência e poder, vê-se livrado das reprimendas contidas no Ordenamento que então vigorava, qual seja: o Código Penal de 1890.
Malandro e perigoso, Cassi já havia se envolvido em problemas com a justiça, mas sempre fora acobertado pela sua família, especialmente sua mãe, que não queria que fosse preso. Assim, conseguia subornar a polícia e continuar impune.
No começo, com a proteção do pai. Ao fim do segundo ou terceiro caso que veio a público, o pai não lhe falou mais e nunca mais se interessou pela sua liberdade. Sucederam-se outros, e, graças à intervenção da mãe junto a um irmão, médico do Exército, ele pôde arranjar rábulas sem escrúpulos, que, pelos meios mais nojentos, conseguiram retirá-lo das grades da detenção. Caluniava as vítimas com justificações em que eram testemunhas Timbó, Arnaldo e outros tais.
Ó também vou mandar uma parte importante para a 'Impunidade' "O Senhor Cassi Jones, de tão pouca idade, relativamente, contava perto de dez defloramentos e a sedução de muito maior número de senhoras casadas. Todas essas proezas eram quase sempre seguidas de escândalo, nos jornais, nas delegacias, nas pretorias; mas ele, pela boca dos seus advogados, injuriando as suas vitimas, empregando os mais ignóbeis meios da prova de sua inocência, no ato incriminado, conseguia livrar-se do casamento forçado ou de alguns anos na correção. Quando a polícia ou os responsáveis pelas vítimas, pais, irmãos, tutores, punham-se em campo para processá-lo convenientemente, ele corria à mãe, Dona Salustiana, chorando e jurando a sua inocência, asseverando que a tal fulana — qualquer das vítimas — já estava perdida, por esse ou por aquele; que fora uma cilada que lhe