carnaval ou o mundo como teatro e prazer
Todo brasileiro nasce num Brasil que tem Carnaval. Sabemos que o Brasil é Brasil por causa do Carnaval. Dizer isso parece trivial, mas não é. Nem todo mundo conheceu o Brasil dos imperadores, dos escravos e das ditaduras. Quantos de vocês, leitores, andaram de bonde? Ou viveram numa São Paulo sem crimes e engarrafamentos colossais e num Rio de Janeiro com a Baía de Guanabara despoluída?
Se a sociedade pode ser comparada a um teatro, então existem coisas passageiras e dramas permanentes que nos dão a certeza de estar vivendo num mesmo lugar. Mudou o estilo de se vestir, de comer e de morar; as cidades ficaram enormes, chegamos à era dos computadores e dos telefones celulares; trocamos a moeda e o mundo globalizou-se. E o Carnaval continua.
Ele tem sido uma das poucas coisas permanentemente nacionais. A repetição festiva, como disse Thomas Mann, é a abolição da diferença entre o ser e o ter sido. Todo ano tem Carnaval – e todo ano é o Carnaval que, talvez mais do que qualquer outra instituição nacional, nos certifica da continuidade do Brasil. Apesar de todas as mudanças, inclusive as que ocorreram no próprio Carnaval. Imaginar um Brasil sem Carnaval seria como imaginar uma noite sem lua ou um arroz sem feijão. Existem planos para acabar com tudo no Brasil, menos para proibir o Carnaval.
Claro que existem Carnavais em outros lugares – senão em todos os lugares. Mas há um “Carnaval brasileiro”. Tem muita gente que jura que ele só existe no Brasil. Daí a necessidade de qualificá-lo – de saber o que ele diz do Brasil.
Outro dia me perguntaram sobre suas origens. Não teria o nosso Carnaval nascido na Índia, nos festivais nos quais as castas se misturam? Na Grécia de Dionísio ou na Roma de Saturno? Respondi observando se ele não teria também nascido na Idade Média, quando Deus brigava diariamente com o Diabo – esse