Canto XIII - Os Lusíadas
Canto VIII
1
NA primeira figura se detinha
O Catual que vira estar pintada,
Que por divisa um ramo na mão tinha,
A barba branca, longa e penteada.
Quem era e por que causa lhe convinha
A divisa que tem na mão tomada?
Paulo responde, cuja voz discreta
O Mauritano sábio lhe interpreta:
2
– «Estas figuras todas que aparecem,
Bravos em vista e feros nos aspeitos,
Mais bravos e mais feros se conhecem,
Pela fama, nas obras e nos feitos.
Antigos são, mas inda resplandecem
Co nome, entre os engenhos mais perfeitos.
Este que vês, é Luso, donde a Fama
O nosso Reino «Lusitânia» chama.
3
«Foi filho e companheiro do Tebano
Que tão diversas partes conquistou;
Parece vindo ter ao ninho Hispano
Seguindo as armas, que contino usou.
Do Douro, Guadiana o campo ufano,
Já dito Elísio, tanto o contentou
Que ali quis dar aos já cansados ossos
Eterna sepultura, e nome aos nossos.
4
«O ramo que lhe vês, pera divisa,
O verde tirso foi, de Baco usado;
O qual à nossa idade amostra e avisa
Que foi seu companheiro e filho amado.
Vês outro, que do Tejo a terra pisa,
Despois de ter tão longo mar arado,
Onde muros perpétuos edifica,
E templo a Palas, que em memória fica?
5
«Ulisses é, o que faz a santa casa
À Deusa que lhe dá língua facunda;
Que se lá na Ásia Tróia insigne abrasa,
Cá na Europa Lisboa ingente funda.»
– «Quem será estoutro cá, que o campo arrasa
De mortos, com presença furibunda?
Grandes batalhas tem desbaratadas,
Que as Águias nas bandeiras tem pintadas!»
6
Assi o Gentio diz. Responde o Gama:
– «Este que vês, pastor já foi de gado;
Viriato sabemos que se chama,
Destro na lança mais que no cajado;
Injuriada tem de Roma a fama,
Vencedor invencíbil, afamado.
Não tem com ele, não, nem ter puderam,
O primor que com Pirro já tiveram.
7
«Com força, não; com manha vergonhosa
A vida lhe tiraram, que os espanta;
Que o grande aperto, em gente inda que honrosa,
Às vezes leis magnânimas quebranta.