Brasil Caboclo
DAS PRÁTICAS ÀS TEORIAS
Marilene A. Grandesso12
As ciências exatas são uma forma monológica de conhecimento: o intelecto contempla uma coisa e pronuncia-se sobre ela. Há um único sujeito: aquele que pratica o ato de cognição (de contemplação) e fala
(pronuncia-se). Diante dele, há a coisa muda. Qualquer objeto do conhecimento (incluindo o homem) pode ser percebido e conhecido a título de coisa. Mas o sujeito como tal não pode ser percebido e estudado a título de coisa porque, como sujeito, não pode, permanecendo sujeito, ficar mudo; consequentemente, o conhecimento que se tem dele só pode ser dialógico.
Bahktin (1992, p. 403)
O exercício de uma prática de terapia envolve sempre um processo reflexivo entrelaçando teoria e prática de uma forma tal, tão intrinsecamente amalgamada, que fica difícil, senão impossível e mesmo sem muita utilidade, determinar que instância prevalece sobre a outra. Todo terapeuta, antes mesmo de definir-se como tal, pertence a uma tradição que estabelece um contexto paradigmático informando suas crenças e valores, num tempo e espaço histórica e localmente situados. Portanto, traçar os desenvolvimentos de um campo, como o da Terapia
Familiar, pressupõe acompanhar as mudanças paradigmáticas e evolutivas no exercício de sua prática em constante construção, decorrentes tanto do contexto teórico das tradições em vigor como do exercício da prática clínica, ambas enredadas num tecido complexo que vai sendo inevitavelmente construído ao se mesclar os fios dos referenciais dos terapeutas, suas distintas práticas e teorias.
Quando penso na dança que um terapeuta faz entre sua prática e o tecido teórico pelo qual pode compreendê-la, inevitavelmente ouço a voz do saudoso e irreverente terapeuta Gianfranco
Cecchin no mega congresso de Novos paradigmas: cultura e subjetividade, em 1991 em Buenos
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Publicado em L. c. Osório