Publicado em 1912, em plena hegemonia do Neoparnasianismo, o Eu de Augusto dos Anjos, poeta paraibano de 28 anos, revelou-se um fenômeno literário absolutamente insólito, inimaginável cercando-se logo de um confuso movimento de admiração e repulsa, que continuaria, aliás, pelas décadas seguintes. Talvez o último fruto do Simbolismo brasileiro, neste caso de índole expressionista, o Eu surgia, apesar de sua impressionante originalidade, da união de duas influências poéticas, a de Cruz e Sousa e a de Cesário Verde, com duas visões do mundo inconciliáveis, o cientificismo evolucionista, haurido sobretudo através de Haeckel e da Escola do Recife, e um impulso místico, uma ânsia de absoluto talvez nunca antes vista na nossa poesia. O resultado, que todos conhecemos, é o que se encontra neste livro, escrito por um poeta de gênio em um estilo de riqueza metafórica incomparável, em métrica comumente mais dura e ortodoxa do que a do mais ortodoxo parnasiano, com uma musicalidade de efeito quase hipnótico da qual poucos simbolistas nossos se aproximaram, de penetração filosófica da realidade, por um impulso gnóstico, enfim, quase sem paralelo na poesia brasileira. Dando sequência à visão torturadamente expressionista da miséria brasileira iniciada por Cruz e Sousa, sobretudo em Faróis, utilizando-se da visão objetiva da realidade comezinha praticada por Cesário Verde, mas dominado por uma ânsia de transcendência irrefreável e muito pessoal, com Augusto dos Anjos tinha entrada na poesia brasileira um riquíssimo vocabulário de cunho cotidiano e científico, o mundo das ruas e o mundo das ideias, ambos vetados pelo mundo dos salões que dominava a poesia oficialmente mundana e ornamental de uma literatura que se queria “o sorriso da sociedade”. Durante décadas incompreendido pela maior parte da crítica – o que é índice de ineficiência da mesma – ignorado pelos modernistas de primeira hora, mais interessados em uma oposição formal que essencial á poesia que se escrevia no