Análise do poema: poema armado
Que o poema venha cantando ao ritmo contagiante do batuque um canto quente de força, coragem, afeto, união
Que o poema venha carregado de amarguras, dores, mágoas, medos, feridas, fomes...
Que o poema venha armado e metralhe a sangue-frio palavras flamejantes de revoltas palavras prenhes de serras e punhais...
Que o poema venha alicerçado e traga em suas bases palavras tijolantes, pontos cimentantes, portas, chaves, tetos, muros
E construa solidamente uma fortaleza de fé naqueles que engordam o exército dos desesperados
Para que nenhuma fera não mais galgue escadas à custa de necessidades iludidas...
E nem mais se sustente com carne, suor e sangue dum povo emparedado e sugado nos engenhos da exploração!
Oubi Inaê Kibuko (Aparecido Tadeu dos Santos, em língua africana) faz uma intensa crítica à humilhação negra através de “Poema Armado”, que já chama atenção por apresentar essa função metalingüística ao se tratar de um poema. Logo nos dois primeiros versos ele já deixa claro o uso dessa função e da sua temática, ao proclamar que o poema deve ser cantado ao ritmo do batuque, a base da música afro-brasileira. No decorrer da obra o autor vai delimitando o que o poema precisa, do que ele munir-se-á. Inicialmente parecem “munições” antagônicas, todavia logo se percebe o contrário: são complementares na condição do negro escravo, do negro súdito. O primeiro conjunto de munição (... força / coragem, afeto, união) se entende pelas relações e características dos negros: a força física aliada à união e à coragem. Entre em cena o segundo conjunto (... amarguras, dores, / mágoas, medos, / feridas, fomes ...), compreendido pelas consequências de seu estado negro. Amarguras, dores, feridas e fomes eram efeitos do castigo dos negros no período escravocrata e são efeitos da sua subjetivada subumanidade em plena Contemporaneidade. As mágoas e medos são somente conclusões de serem oprimidos, subjugados e açoitados até hoje. Mais