Antes

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Antes, porém, de demonstrar como esses dois planos discursivos atuam no texto de Raynal, iniciamos com algumas questões caras ao Século das Luzes, perante as quais o ilustrado não se furta de um posicionamento. Elas passam pelas polêmicas encetadas por Buffon e De Pauw, aludidas brevemente no capítulo anterior. Das partes da História das duas Índias selecionadas para a realização da presente pesquisa, o livro XVII da versão de 1780 se destaca no tratamento desses temas.

3.1. A América e os americanos

Por muito tempo o Novo Mundo rendeu relatos importantes, crônicas extensas, porém insuficientes para revelar sua verdadeira história. Pode-se dizer que a respeito dele ministraram um conhecimento falho, afinal “não seriam soldados bárbaros nem mercadores ávidos”, autores de narrativas concernentes ao assunto, os sujeitos mais apropriados para fornecer “ideias justas e aprofundadas dessa metade do universo”. Somente a filosofia poderia oferecer noções corretas sobre a América, sondar “como a natureza a fez e conhecer suas relações com o restante do globo”. Para ser mais exato, segundo Raynal apenas a Filosofia das Luzes seria capaz disso.
Estamos diante de uma expressão do que Jorge Cañizares-Esguerra classificou como a emergência de uma nova “arte de leitura” na segunda metade do Setecentos, a qual colocou em cheque os textos sobre a América legados pelos séculos anteriores. Muitos entre eles teriam sido corrompidos pela ignorância e pela superstição, quando não pela barbaridade e pelos ávidos interesses de seus autores, como Raynal nos revela acima. Tratava-se de relatos oriundos de percepções indisciplinadas ou enviesados pelas necessidades de momento, portanto insuficientes para dar conta do tema que propunham elucidar. Negando-lhes legitimidade, a “arte de leitura” em ascensão estipulava um novo padrão de escrita, cujos pressupostos básicos indicavam a necessidade de informações confiáveis fornecidas pela apreciada figura do “viajante filósofo” e de

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